Grito entalado na garganta

Por Marcus Purcino

Na noite úmida e arejada do lampejo final de agosto, 52.659 pessoas assistiram a representação do que é o São Paulo Futebol Clube nos últimos onze anos. A eliminação? A vitória inútil? O vexame? A tristeza? Não! A sua torcida. 

Não acho que exista em qualquer outro clube brasileiro uma torcida tão importante para seu time quanto a do São Paulo. Em 2017, se não fosse por seu torcedor presente no pior momento da história do clube, talvez o fantasma do rebaixamento seria mais um dos poltergeists que assombram os sonhos daqueles que amam essa instituição. Não é atoa que o time está próximo de bater o recorde de público total em uma única temporada. Nesse ano, o tricolor já vendeu 1.210.197 ingressos, faltando apenas 50.510 ingressos para se igualar a marca de 1.260.707, alcançada no ano passado.

O papel que ela representa dentro de campo pode ser comparado a alguém empurrando um carro pela rua, enquanto seu motorista tenta a todo custo ligar o motor que subitamente morrera. Às vezes dá certo, e o carro consegue voltar a funcionar, mas quando o problema é a falta de combustível, não há impulso que resolva. E naquela noite de 31 de agosto faltou combustível, faltou óleo no motor, faltou aquele cheirinho pendurado no retrovisor interno, que nos dá a sensação de que tudo vai dar certo. Faltou Calleri fazer aquele gol na cara do goleiro e faltou James Rodriguez acertar a sua cobrança de pênalti. A única coisa que não fez falta foi a vibração de uma massa apaixonada, que em nenhum segundo deixou de conduzir e cantar. O Morumbi parou quando Arboleda voou, e tremeu quando aterrissou, mas nem o mais alto dos impulsos foi capaz de fazer com que o time pulasse de fase.

Infelizmente, torcida não entra em campo, torcida não faz gol (mas também não erra) e torcida não ergue troféu, porém pelo jeito, nem o São Paulo. Muitos dizem que o torcedor é o 12° jogador de um time, mas não acho que seja verdade, pois se fosse, o São Paulo jamais perderia. Não é atoa que até o momento, no campeonato brasileiro, longe de sua casa (e de seus exímios moradores) o tricolor do Morumbi não possui nenhuma vitória. Mas como transformar a vibração do estádio em resultado? Com apenas reza que não é, já que estamos falando do clube da fé. Na verdade, é preciso de um outro tipo de crença. Crença no processo de reconstrução desse time que vem a anos sendo depenado por más gestões, empresários sangue-sugas e jogadores pés de rato.

O grito de classificação entalado na garganta de todo são-paulino hoje não é diferente dos inúmeros outros acumulados nos últimos anos. O clamor dos gols que não foram feitos hoje vão reverberar nas arquibancadas do Cícero Pompeu de Toledo tanto quanto as derrotas reverberam na mente da sua torcida. 

Porém, São Paulo é sentimento que jamais se acabará, e o eco da queda que permeia as entranhas do entusiasta tricolor, jamais calará o brado de amor pelo vermelho, branco e preto. E assim, como se fosse gasolina, o torcedor são-paulino mais uma vez há de se preparar para encher o tanque do carro de três cores, levando-o novamente por estradas tortuosas, e quem sabe finalmente liberando do peito e do coração o grito de campeão.

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